PARECER DO PROJETO DE LEI DO SENADO N° 285, DE 1999
Da COMISSAO DE CONSTlTUIÇAO, JUSTIÇA E CIDADANIA, sobre o Projeto de Lei do Senado n° 285, de 1999, que regulamenta a experimentação técnico-científlca na área de engenharia genética, vedando os procedimentos que visem à duplicação do genoma humano com a finalidade de clones de embriões de seres humanos, e dá outras providências.

RELATOR: Senador LEOMAR QUINTANJLHA

Foi distribuída a esta Comissão de Constituição, de Justiça e Cidadania (CCJ) o Projeto de Lei do Senado n° 285, de 1999, de autoria do ilustre Senador Sebastião Rocha, que regulamenta a experimentação técnico-científica na área de engenharia genética, vedando os procedimentos que visem à duplicação do genoma humano com a finalidade de clones de embriões de seres humanos. Após análise desta Comissão, a matéria será apreciada, em caráter terminativo, pela Comissão de Assuntos Sociais.
A proposição em exame veda a manipulação genética de células germinativas e de células somáticas humanas para fins de clonagem em seres humanos (art. 1°).

Ainda de acordo com o projeto, os procedimentos relacionados à produção de clones de animais deverão ser submetidos à aprovação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio ).

O art. 2° do PLS n° 285/99 tipifica como crime a violação do disposto na norma, sujeitando os patrocinadores, financiadores, técnicos, cientistas e responsáveis técnicos do estabelecimento onde se efetuarem os procedimentos de clonagem à pena de reclusão de 6 a 20 anos.

A matéria, inicialmente, recebeu parecer do Senador Antônio Carlos Valadares, com voto pela aprovação na forma de substitutivo oferecido, que, no entanto, não chegou a ser apreciado pela Comissão. O projeto foi redistribuído em virtude de o Senador Valadares não mais pertencer à CCJ .

Por fim, ressaltamos que no prazo regimental não foram apresentadas emendas.

II - ANÁLISE

Não haveria momento mais oportuno do que o atual para proceder à analise de matéria que, nos últimos dias, tornou-se o foco das atenções nacionais e internacionais.

O recente anúncio de que uma empresa norte-americana logrou produzir o. primeiro embrião humano clonado reacendeu o debate sobre os limites técnicos e éticos da manipulação genética de células humanas para fins de clonagem reprodutiva ou terapêutica.

Essa notícia suscitou críticas no mundo todo, tanto de setores conservadores, como também de parte da comunidade científica, e deverá acelerar a aprovação de leis proibindo qualquer espécie de clonagem humana.

O projeto de lei do Senador Sebastião Rocha objetiva, como já relatado, vedar a clonagem humana em todo o território nacional, indo ao encontro da tendência mundial nesse tema.

Do ponto de vista constitucional, observamos que a matéria insere-se no rol daquelas cuja competência legislativa é privativa da União ( art. 22, inciso I) e está em consonância com o art. 61, § 1°, inciso II da Carta Magna, que dispõe sobre a iniciativa das leis.

Entretanto, julgamos que a proposta, a despeito do seu mérito, é passível de aperfeiçoamento, com a finalidade de retificar e atualizar alguns aspectos técnicos e adequar o projeto à Lei Complementar n° 95, de 26 de fevereiro de 1998, que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis. Essa norma estabelece, entre outros preceitos, que o mesmo assunto não poderá ser disciplinado por mais de uma lei, exceto quando a subseqüente se destine a complementar a lei considerada básica, vinculando-se a esta por remissão expressa (art. 7°, JV).

O Senador Antônio Carlos Valadares, no relatório inicialmente apresentado à CCJ e que não foi objeto de deliberação, faz uma competente e rigorosa análise da matéria, culminando pelo oferecimento de um substitutivo, com o qual manifestamos plena concordância, razão pela qual tomamos a liberdade de fazer nossas as sua palavras:

Em primeiro lugar, conforme recomenda a Lei Complementar n° 95, de 26 de fevereiro de 1998, o assunto não deve ser tratado em matéria autônoma e independente, uma vez que do ordenamentojurídico nacional já consta a Lei n° 8.974, de 5 de janeiro de 1995, que 'Regulamenta os incisos II e V do § 1° do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas para o uso das técnicas de engenharia genética e liberação no meio ambiente de organismos geneticamente modificados, autoriza o
Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, e dá outras providências'.

Apesar de essa lei dispor especificamente acerca do universo dos organismos geneticamente modificados (OGM), ela possui dispositivos que tratam da intervenção em material genético humano e proíbe, nas atividades relacionadas a OGM, 'a manipulação genética de células germinais humanas' [células responsáveis pela formação de células reprodutoras]; 'a intervenção em material genético humano in vivo, exceto para o tratamento de defeitos genéticos, respeitando-se princípios" éticos, tais como o princípio de autonomia e o princípio de beneficência, e com a aprovação prévia da CTNBio '; e 'a produção, armazenamento ou manipulação de embriões humanos destinados a servir como material biológico disponível' (incisos II, III e IV; do art. 8° da Lei n°8.974, de 5 de janeiro de 1995).

Assim, o mais apropriado é incluir a clonagem humana no universo abrangido pela lei, alterando, primeiramente, o texto da ementa. Ao fazer essa alteração, pode-se também sanar a falha ali existente: o trecho 'autoriza o Poder Executivo a criar, no âmbito da Presidência da República, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança' perdeu o sentido quando o Presidente da República vetou - por vício de iniciativa - os dispositivos que autorizavam a criação do órgão; assim, esse trecho deve ser retirado.

Em seguida, propõe-se a inclusão de um inciso VII no art. 8° para vedar a clonagem humana. Utiliza-se, com esse fim, redação semelhante à do inciso V; do art. 1°, da Instrução Normativa n° 8, da CTNBio, que "Dispõe sobre a manipulação genética e sobre a clonagem em seres humanos ". Isso porque essa redação é mais abrangente do que aquela proposta no projeto em análise e, pelo menos em teoria, a clonagem pode ocorrer sem que haja "manipulação do genoma humano '; isto é, um outro indivíduo pode-se originar da simples multiplicação de uma célula com genoma [conjunto de genes - material hereditário] original não manipulado.

Faz-se necessário, nesse caso, suprimir do caput do art. 8° o trecho que limite as vedações ali estabelecidas às 'atividades relacionadas a OGM'.