PARECER DA ADVOGADA ELIANE MOREIRA SOBRE OS PROJETOS DE LEI N º 4610/98, Nº 4900/99 e Nº 1934/99

1. Relatório

Através do presente parecer jurídico, pronunciamo-nos sobre os Projetos de Lei nº 4610/98, nº 4900/99 e nº 1934/99, todos em tramitação na Câmara dos Deputados.

Os referidos Projetos objetivam regulamentar o uso e acesso à informações genéticas dos seres humanos, e se destinam à evitar atos discriminatórios, através da criminalização de tal conduta.

A iniciativa da propositura dos referidos projetos é sobremaneira louvável, sendo inegável sua relevância para os interesses nacionais. Dessa feita, as referências que ora são aduzidas tem por objetivo incentivar as atividades legislativas.

2. Fundamentação Jurídica

Da análise dos documentos que instruem a solicitação de parecer é possível concluir pela complementariedade dos Pls, isto porque, o Pl nº 4900/99 trata da repreensão das atividades discriminatórias de forma bastante mais ampliada, versando sobre questões conceituais, e principiológicas, que podem nortear o assunto de forma mais eficaz.

Por outro lado, os Pls nº 4610/98, dispõe sobre a criminalização dos atos decorrentes de discriminação genética, e finalmente, o Pl nº 1934/99 propõe a regulamentação do uso e divulgação do genoma humano.

2.1 Projeto de Lei no 4610/98

O Pl nº 4610/98 pode inserir-se como um capítulo do Pl nº 4900/99, dessa feita, parece de bom aviltre acrescer alguns elementos essenciais à sua eficácia, nesse sentido podemos sugerir algumas modificações ao texto em tramitação.

No parágrafo 2, onde se lê: "A realização de testes preditivos de doenças genéticas ou que permitam identificar a pessoa como portadora de um gene responsável por uma doença ou pela suscetibilidade ou predisposição genética a uma doença só é permitida com finalidades médicas ou de pesquisa médica e após aconselhamento genético, por profissional habilitado", leia-se "A realização de testes preditivos de doenças genéticas ou que permitam identificar a pessoa como portadora de um gene responsável por uma doença ou pela suscetibilidade ou predisposição genética a uma doença só é permitida com finalidades médicas ou de pesquisa médica e mediante consentimento prévio, antecedido de aconselhamento genético, por profissional habilitado"

No que se refere às penas previstas, sugere-se a previsão de períodos maiores, de no mínimo um ano e no máximo 3 anos de detenção, sem prejuízo da cumulação com multa.

Por outro lado, no art. 4, é cabível sugerir a inclusão dos seguros de saúde na tipificação penal.

Verificando a redação proposta para o art. 5, acreditamos, ser mais adequado propor que se altere a redação no seguinte sentido, onde se lê: 'Recusar, negar ou impedir a matrícula, o ingresso ou permanência de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau, bem como as outras formas de treinamento, atualização profissional ou programa de educação continuada, com base em informação genética da pessoa", leia-se: "Recusar, negar, impedir a matrícula, ou criar qualquer outro tipo de dificuldade para o ingresso ou permanência de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado de qualquer grau, bem como a outras formas de treinamento, atualização profissional ou programa de educação continuada, com base em informação genética da pessoa".

Afigura-se conveniente promover a separação do texto oferecido ao artigo 6, desmembrando-o em dois tipos penais diferenciados, da seguinte forma: "recusar, negar ou impedir inscrição em concurso público ou em quaisquer outras formas de recrutamento e seleção de pessoal com base em informação genetica do postulante: Pena: detenção de ....... a ....... anos, e multa" e em outros artigos restaria determinado: "Obstar, impedir, ou proferir ameaças relativas ao acesso ou permanência em trabalho, emprego, cargo, ou função, na Administração Pública ou na iniciativa Privada: detenção de ....... a ....... anos, e multa".

É possível vislumbrar uma certa incongruência jurídica no artigo 7, pois, segundo disposto em sua redação, impedir ou obstar casamento ou convivência familiar e social de pessoas com base em informação genética definido como tipo penal. É de se atentar para a vedação legal constante do art. 183 do Código Civil, que em seus incisos I, II, IV, que identificam como impedimento dirimente absoluto ao casamento as relações de parentesco que ali indica, admitindo-se, somente a ressalva do Decreto nº 3200/41, que admite o casamento de colaterais em terceiro grau. A fim de solucionar o referido problema, sugere-se acrescentar o parágrafo ao artigo, ressalvando os casos expressamente vedados pelo Código Civil.

No sentido das inovações trazidas pelos recentes textos penais, é a desconsideração da personalidade jurídica, que tem se demonstrado de grande eficácia na aplicabilidade das sanções penais.

2.2 Projeto de Lei 4900/99

Sem dúvidas, afigura-se como o PL mais abrangente, pois explorou fatores outros que não a mera repressão, ou reparação, mais por outra, a determinação de mecanismos para a prevenção de atos discriminatórios.

Incumbe tecer algumas considerações no sentido complementar o PL. Inicialmente, verifica-se que o objetivo do PL, deveria ser ampliado, em realidade, é recomendável evitar enumerações taxativas em texto legais, principalmente quando dizem respeito à assuntos ainda não suficientemente consolidados socialmente, por essa razão, interessante seria, que no artigo 1, não fossem elencados as situações de aplicabilidade, podendo-se citar, mais não promover enumeração taxativa.

No art. 3, parágrafo 2, não é cabível a restrição da nuência somente aos casos dos incisos I e II, mais recomendável, portanto, simplificar a redação: “exigir-se-á autorização da pessoa cuja informação genética pretende-se obter, ou de seu representante legal”.

Por outro lado, no artigo 4, inciso primeiro, necessário se faz, alteral a redação proposta, pois conforme disposto no art. 135 do Código Civil, o instrumento particular, fará prova, desde que subscrito por duas testemunhas.

Verifica-se, ainda, no art. 6 parágrafo 2, vedação imposta aos sindicatos, impossibilitando-os de excluir de seus quadros, dentre outras práticas nocivas, pessoas em função de sua informação genética, observa-se, que tal disposição teria seu alcance alargado, se ao invés de remeter-se a sindicatos, o legislador fizesse remissão à associações.

No que se refere ao tipo de Ação Penal, perante a gravidade do crime cometido, a Ação Penal deve ser Pública Incondicionada, e não Privada conforme sugere o art. 8, parágrafo 2, até mesmo, para que não se favoreça a impunidade, posto que, se o próprio ofendido necessitar ingressar com a Ação Penal, o medo de sofrer represálias pode parasilar seu intento.

Absolutamente incompreensível a reversão dos valores aferidos através da aplicação de multas previstas no PL, para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos e Coletivos, conforme determina o parágrafo 3, do art. 8, até, porque o bem aqui protegido não se encontra albergado pela Lei nº 7347/85.

2.3 Projeto de Lei no 1934/99

No que se refere ao Pl nº 1934/99, acreditamos que a mens legis não cumpre a finalidade de proteção almejados, verifica-se que nos artigos apresentados o elemento norteador da proposta é a livre divulgação, vedando-se, apenas, a má utilização da informação, mas, em verdade, não é este o ponto a ser atacado pela regulamentação, a opção de divulgar ou não a informação deve ser dada à pessoa portadora da informação genética, mais do que isso, a forma de utilização dessa informação é decisão que incumbe ao indivíduo, como forma de assegurar seu direito constitucional à intimidade. Por essa razão, não nos parecem adequados os artigos propostos, por sua patente inconstitucionalidade à luz do art. 5. Inciso X da CF-88, projetando-se contra os direitos individuais.

III Conclusão

Ex positis, é de se reafirmar a louvável iniciativa dos Senhores legisladores, no entanto, é de se reconhecer a necessidade de ampliar a discussão da questão que se proposta, sendo principalmente relevante reafirmar a necessidade de participação do Ministério da Saúde no processo legislativo, com a finalidade de apresentar suas contribuições ao debate.

Sendo o que cumpria expor, subscrevemos-nos

Eliana Moreira
OAB/SP 148.839