PROJETO
DE LEI Nº 329/2003
Autor:
Deputado Acarisi Ribeiro
Dispõe
sobre a criação do conselho estadual de bioética
no estado do Rio de Janeiro.
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RESOLVE:
Art. 1º - Fica criado, no âmbito do
governo do Estado do Rio de Janeiro, o Conselho Estadual de Bioética
e Biossegurança, órgão consultivo, normativo
e deliberativo composto por membros efetivos e suplentes, designados
pelo Governador do Estado, e constituído, paritariamente,
por representantes do poder público e da sociedade civil,
nas áreas de: saúde, agricultura, pecuária,
meio ambiente, biotecnologia, filosofia (bioética), biossegurança,
recursos genéticos, defesa do consumidor, segurança
alimentar, doação de órgãos e tecidos,
clonagem, reprodução humana, diagnóstico
pré-natal, transgenia e eutanásia.
Art. 2º - A Comissão de que trata
o artigo anterior terá as seguintes competências:
I - acompanhar o desenvolvimento técnico
e científico, objetivando a segurança da população
em geral e do meio ambiente;
II - Analisar e emitir parecer sobre temas que
envolvam a vida, em qualquer de suas formas, em face de questões
como a transgenia, a clonagem, a fertilização artificial,
a gestação, a eutanásia, a doação
de órgãos e tecidos, os alimentos transgênicos,
a biopirataria e outros;
III - Analisar e emitir parecer sobre a produção,
a comercialização, o armazenamento, o transporte,
a manipulação e a liberação no meio
ambiente, de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) ou produtos
que contenham ou tenham utilizado OGM em qualquer fase de seu
processo produtivo;
IV - Colaborar com a Comissão Técnica
Nacional de Biossegurança (CTNBio) nas matérias
de sua competência;
V - Recomendar aos órgãos de Vigilância
Sanitária Municipais, Estadual e Federal a cassação
ou a suspensão do registro de OGM ou produto que contenha
ou tenha utilizado OGM em qualquer fase de seu processo produtivo,
que não atenda ao disposto na legislação
pertinente;
VI - Propor e divulgar Normas Técnicas
de segurança alimentar, ambiental e de saúde relativas
à pesquisa, à comercialização, à
manipulação e à liberação no
meio ambiente de OGM ou produto que contenha ou tenha utilizado
OGM em qualquer fase de seu processo produtivo;
VII - Promover e divulgar estudos e pesquisas
sobre OGM ou produto cujo material genético tenha sido
modificado por técnica de engenharia genética durante
qualquer fase de seu processo produtivo e demais matéria
sobre sua competência;
VIII - Apresentar subsídios à regulamentação
técnica necessária à implementação
desta Lei;
IX - Escolher e sugerir ao Poder Executivo os
órgãos Estaduais competentes para autorizar a execução
de atividades que envolvam questões de sua competência.
Parágrafo único - É facultado
à Comissão Estadual de Bioética e Biossegurança
a constituição de um Grupo Técnico Assessor,
com função consultiva, formado por profissionais
com reconhecido conhecimento técno-científico nas
áreas de competência da Comissão.
Art. 3° - A pesquisa, a produção,
o plantio, a comercialização, o armazenamento, o
transporte, a manipulação e a liberação
no meio ambiente de OGM ou de produto que contenha ou tenha utilizado
OGM em qualquer fase de seu processo produtivo observarão,
além do estabelecido na Legislação Federal
em vigor, as normas fixadas nesta Lei.
Art. 4° - Para a consecução
dos objetivos previsto nesta Lei, o Poder Executivo manterá
cadastro das instituições que exercerem as atividades
descritas no Art. 3º e fiscalizará qualquer atividade
ou projeto realizado no Estado que envolva OGM ou produto que
contenha ou tenha utilizado OGM em qualquer fase de seu processo
produtivo.
Art. 5° - O experimento de campo que envolva
OGM ou produto que contenha ou tenha utilizado OGM em qualquer
fase de seu processo produtivo depende de Estudo e Relatório
de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) e do respectivo licenciamento
do órgão competente.
§ 1° - O EIA/RIMA referente à
atividade ou projeto desenvolvido por instituição
pública ou privada de ensino ou pesquisa poderá
ser realizado pela própria entidade, desde que habilitada
pelo órgão estadual competente.
§ 2° - Ficam dispensadas do licenciamento
que trata o caput deste artigo as atividades de pesquisa científica
que envolvam OGM desenvolvidas por instituições
que detenham o Certificado de Qualidade em Biossegurança,
que tratam o § 3º do Art. 2º da Lei Federal nº
8.974, de 5 de janeiro de 1995, e o Art. 8º do Decreto Federal
nº 1.752, de 20 de dezembro de 1995.
§ 3° - Todo projeto, mesmo enquadrado
na hipótese prevista no artigo anterior, deverá
ser encaminhado à Comissão Estadual de Bioética
de Biossegurança.
Art. 6º - O projeto de pesquisa que envolva
OGM ou produto que contenham ou tenham utilizado OGM em qualquer
fase de seu processo produtivo, observados o disposto no Art.
3º e as normas de biossegurança, será precedido
de:
I - Inscrição de cadastro de que
trata o Art. 4º desta Lei;
II - Parecer favorável da Comissão
Estadual de Bioética e Biossegurança;
III - Autorização das Secretarias
de Estado de Agricultura, de Abastecimento, Pesca e Desenvolvimento
do Interior, do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, de Saúde
e de Ciência, Tecnologia e Inovação, diante
das especificidades do projeto, conforme definição
e indicação da Comissão Estadual de Bioética
e Biossegurança.
Parágrafo único - Fica dispensada
da autorização que se refere o inciso III deste
artigo a instituição de pesquisa científica
que detenha o Certificado mencionado no § 2º do Art.
5º desta Lei.
Art. 7º - Para produzir, armazenar, transportar,
manipular ou liberar no meio ambiente OGM ou produto que contenha
ou tenha utilizado OGM em qualquer fase de seu processo produtivo,
em escala industrial ou comercial, as entidades e instituições,
públicas ou privadas, observarão as seguintes exigências:
I - Comprovação do registro de
produto no órgão competente;
II - Inscrição no cadastro de que
trata o Art. 4º desta Lei;
III - Apresentação dos resultados
de análise de risco à saúde humana, a ser
obtido junto a estabelecimento técnico autorizado pela
Comissão de Bioética e Biossegurança;
IV - Parecer favorável da Comissão
Estadual de Bioética e de Biossegurança;
V - Autorização das Secretarias
de Estado de Agricultura, de Abastecimento, Pesca e Desenvolvimento
do Interior, do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, de Saúde
e de Ciência, Tecnologia e Inovação, no âmbito
de suas respectivas competências, conforme definição
da Comissão de Bioética e Biossegurança.
Art. 8º - O descumprimento do disposto nesta
Lei constitui infração administrativa e sujeita
seus responsáveis às seguintes penalidades, que
deverão ser cumulativas, sem prejuízo de outras
sanções cíveis e penais cabíveis:
I - Apreensão de produtos, máquinas
e equipamentos;
II - Suspensão da atividade;
III - Interdição da área;
IV - Multa;
V - Reparação de danos.
Art. 9º - Compete às Secretarias
de Estado acima designadas, dentro de suas competências
e observando parecer técnico conclusivo da Comissão
Estadual de Bioética e Biossegurança:
I - Manter cadastro atualizado de OGM ou produto
que contenha ou tenha utilizado OGM em qualquer fase de seu processo
produtivo e das pessoas físicas e jurídicas que
desenvolvam atividades a eles relacionadas, observando o disposto
nos Artigos 6º e 7º desta Lei;
II - Fiscalizar e monitorar a pesquisa, a produção,
o plantio, a comercialização, o armazenamento, o
transporte, a manipulação e a liberação,
no meio ambiente de OGM ou de produto que contenha ou tenha utilizado
OGM em qualquer fase de seu processo produtivo;
III - Autorizar a realização de
projeto ou atividade que envolva OGM ou produto que contenha ou
tenha utilizado OGM em qualquer fase de seu processo produtivo,
nos termos do disposto nos Artigos 6° e 7° desta lei;
IV - Aplicar as penalidades definidas nesta lei
e cumulativamente aquelas previstas na Lei Federal n° 8.974,
de 5 de janeiro de 1995, sem prejuízo das sanções
penais cabíveis de que tratam as Leis Federais números
9.605, de 12 de fevereiro de 1998, e 8.078, de 11 de setembro
de 1990.
Art. 10 - A Fundação de Amparo
a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) destinará
recursos orçamentários específicos para o
financiamento de projetos, atividades, treinamento e capacitação
do Corpo Técnico do Estado, relacionados com as pesquisas
que envolvam matérias de competência da Comissão
Estadual de Bioética e Biossegurança.
Parágrafo único - Os recursos provenientes
da aplicação e cobrança das sanções
previstas no Artigo 8º, retro, serão utilizados no
custeio das atividades que envolvam as matérias que trata
esta Lei, especialmente no treinamento e capacitação
de servidores que trabalhem com bioética e biossegurança
junto às Secretarias de Estado acima nominadas e às
Universidades Estaduais.
Art. 11 - As empresas que já exercerem
atividades relacionadas com OGM ou produto que contenha ou tenha
utilizado OGM, ou outras matérias de interesse desta Lei,
em qualquer fase de seu processo produtivo, têm o prazo
de cento e oitenta dias, contados da publicação
desta Lei, para se adaptarem às suas exigências.
Art. 12 - Esta Lei será regulamentada
pelo Poder Executivo no prazo de cento e oitenta dias, ouvida
a Comissão de Bioética e Biossegurança.
Art. 13 - Esta lei entra em vigor na data de
sua publicação, revogadas as disposições
em contrário.
JUSTIFICATIVA
Os temas relativos à genética são
tão relevantes, enigmáticos, confusos e amedrontadores
à atualidade quanto a chegada dos astronautas à
lua. Desde clonagem, reprodução assexuada, transgênicos
até organismos geneticamente modificados, são séries
mais séries de questões que desabam todos os dias
sobre nossas cabeças, especialmente pelos meios de comunicação,
e nos preocupam a todos: parlamentares, educadores, religiosos,
pais de família e cidadãos em geral.
Este quadro mostra que é mais do que necessário
possibilitarmos a existência de um órgão realmente
preparado para o enfrentamento destas questões e que nos
subsidie a todos, que permitam a nós todos tomar conhecimento
destes acontecimentos todos sob todos os seus aspectos, não
só o espetaculoso, que é o que geralmente chama
a atenção e é explorado até a exaustão
pela mídia, e toma conta de nossas rodas de conversa, mas,
muito especialmente, do ponto de vista da ciência, da segurança
e da ética!
A capacidade humana de avançar nos mais variados campos
da ciência e da cultura, de estabelecer conexões
antes inimaginadas entre os mais distintos segmentos da técnica,
desenvolvendo, assim, de forma assombrosa, novos conceitos e novas
tecnologias, chegando ao espantoso caso de desenvolver a própria
vida a partir de qualquer segmento de qualquer ser vivo - de uma
única célula, até mesmo, reconstituindo ou,
melhor dizendo, constituindo um novo ser, em tudo semelhante à
matriz original!
E o que pensar, dizer e decidir sobre tudo isso?
Na verdade, estas questões são, sob certos aspectos,
nem tão novas assim, se verificarmos que algumas civilizações,
ou povos, há milênios, praticam uma espécie
de seleção natural com as próprias mãos,
às vezes sob o manto eufemístico do ritual religioso,
de modo a eliminar seres gerados defeituosamente, ou, o que nos
parece ainda mais repugnante, para assegurar um primeiro filho
varão, fato que até hoje se dá em certo recônditos
do Planeta, como, por exemplo, entre tribos aborígenes
australianas e neo-zelandesas.
No mundo vegetal, estas experiências foram tocadas celeremente,
ao ritmo das necessidades de produção, de comercialização
e de transporte, em nome da lei intocável do lucro maior
ao menor custo.
Hoje, contudo, o tema da manipulação dos genes e
da própria vida, enfim, nos causa desconforto, para dizer
o mínimo. E não são, nem serão, poucos
os que se travestem e se travestirão de profetas de um
novo mundo, quem sabe com alguma razão, quem sabe sem nenhuma,
a pretender conduzir nosso entendimento, nossas convicções
e nossos destinos neste novo e empolgante milênio, por estas
sendas até então jamais percorridas, de clonagens,
de transplantes, de eutanásia, de aborto, de fertilização
artificial, etc.
Julgamos mais do que tempo de se constituir, no Estado um organismo
que nos auxilie tecnicamente nestes temas. Com este projeto, queremos
formar uma Comissão de alto nível, integradas por
eminentes cidadãos das áreas pública e privada,
dotados de saber, de sensibilidade, de visão, de afeto
e de profundo amor à vida, capazes, portanto, de tomar
conhecimento, de aprofundar, de ampliar, de debater e de definir
posicionamentos em relação a cada um destes complexos
assuntos ligados à genética, à reprodução
da vida, à família, à alimentação,
ao meio ambiente, sempre sob o ponto de vista inafastável
da Segurança e da Ética.
Creio, verdadeiramente, que, com a aprovação desta
iniciativa, não só estaremos agregando ao dia a
dia do Rio de Janeiro um importantíssimo órgão
de consulta, de deliberação, como estaremos prestando,
mais uma vez, inestimável serviço a toda a Nação
brasileira e, por que não, ao Mundo inteiro, tamanha a
relevância da matéria a ela confiada.
PLENÁRIO
BARBOSA LIMA SOBRINHO, 24 de abril de 2003
Deputado Estadual Acárisi Ribeiro Guimarães