PROJETO DE LEI Nº 6613, DE 2002

Autor: Deputado Virgílio Guimarães

Altera o art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002.

(A Comissão de Constituição e Justiça e de Redação - art. 24, II.)

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher.
§ 1 ° Decai o direito a que se refere este artigo se o marido não ajuizar a ação no prazo de 4 anos a contar do dia em que tomou ciência do nascimento.
§ 2° Ajuizada a ação, os herdeiros do impugnante tem direito de prossegui-la."

JUSTIFICATIVA
Apesar de ter sido aprovado recentemente pelo Congresso Nacional, o novo Código Civil brasileiro, em razão da extensão e complexidade da matéria de que trata, não esta imune a criticas e sugestões.

Este fato foi reconhecido, inclusive, pelo próprio Relator, deputado Ricardo Fiiza, em diversas oportunidades, tal como na audiência pública, realizada em 13 de setembro de 2000, convocada especialmente para ouvir a ilustre Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Maria Berenice Dias, e o Professor Titular de Direito Civil e Direito Romano da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Álvaro Vilaca de Azevedo:

"(...) Ocorre que temos uma vocatio legis de doze meses, que trabalha favoravelmente. O entendimento da Comissão, dos Sub-Relatores a que, tão logo aprovemos o Código, devemos apresentar os vários projetos que tramitam regimentalmente - não na forma de código - e aprová-los em caráter de urgência. 0 objetivo e que eles entrem em vigor concomitantemente ao encerramento da vocatio do novo Código."

A presente proposição visa alterar o art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro que, contrariando a tradição do Direito Civil, revogou os prazos para o pai impugnar a paternidade do filho nascido do casamento.

0 código Civil de 1916 determina que o prazo para o marido contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher a de 2 meses, contados do nascimento, se estiver presente (art. 178, § 3°), ou de 3 meses, se estiver ausente do lar ou se Ihe for ocultado o nascimento, contados, respectivamente, do dia de seu retorno ou do que tomou conhecimento do fato (art. 178, § 40, I).

No projeto original, os prazos para o marido impugnar a paternidade dos filhos havidos de sua mulher eram os mesmos existentes no Código Civil de 1916, conforme os §§ 1 ° e 2°, do art. 1.610, do Projeto de Lei n° 634/75.

A atual redação, que proclama a imprescritibilidade da ação do marido para contestar a paternidade do filho matrimonial, resultou de emenda do relator, Deputado Ricardo Fiuza, que entendeu ser o prazo decadencial incompatível com a "imprescritibilidade das ações de estado" proclamada no art. 27, do Estatuto da Criança e do Adolescente".

Ocorre, que, em Direito, "prescrição" e "decadência" são institutos diferentes. As ações de estado, de fato, nunca foram suscetíveis de prescrição. Contudo, o direito de impugnar a paternidade sempre foi sujeito a prazos decadenciais.

Assim a em todos os paises de cultura jurídica romano-germanica, nos quais há sempre prazos para o pai contestar a paternidade dos filhos matrimoniais. Em Portugal, por exemplo, o prazo e de 2 anos (Código Civil, art. 1.842), na Espanha, de 1 ano (Código Civil, art. 136), na Argentina, de 1 ano (Código Civil, art. 259), na Franca de 6 meses (Código Civil, art. 326).

Além disso, ao deixar de submeter a prazo o direito de contestar a paternidade dos filhos matrimoniais, discrimina-se estes frente aos não-matrimoniais e adotivos, que, na vigência do novo Código Civil não poderão ter a paternidade contestada, seja: a) por terem a paternidade reconhecida judicialmente, pela imutabilidade da coisa julgada; b) por terem sido reconhecidos voluntariamente, sendo irrevogável o reconhecimento (arts. 1.609 e 1.610, do novo Código Civil); c) em caso de adoção, por ser esta, logicamente, irrevogável (Lei n° 8.069, art. 48).

Ou seja, a vitaliciedade do direito, do pai, de impugnar a paternidade será ameaça exclusivamente voltada aos filhos matrimoniais, situado, obviamente, discriminatória e injusta.

E imperioso estabelecer limite temporal ao direito de impugnar a paternidade, como demonstrado pelo Professor Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da UFMG, João Baptista Villela:

'Todos os argumentos que militam em favor da prescrição - estabilidade das relacoes jurídicas, os limites da memória, a segurança, a certeza, etc. - ganham aqui um especial e extremo relevo. Se a uma situação patrimonial modesta e reles já convém beneficiar com os favores da indisputabilidade prescricional, tornando-a preclusa e, portanto, imune a questionamentos, o que não dizer da paternidade, ela própria a encarnação do sólido e do permanente no universo afetivo de cada um? Pai e o contraponto da fragilidade e da insegurança em que esta irremediavelmente imersa a criança, com seus medos e desvalias. Pai a ainda o porto aonde ocorrem os adultos nas crises que o destino lhes propõe e de que nenhuma alma esta livre. Morto, a imagem do pai continua a ser evocada e a cumprir seu misterioso destino de pensar as feridas do tempo. As ciências e as artes ditas da alma - psicologia, psiquiatria, psicanálise, etc., - já insistiram ad nauseam na indispensabilidade de uma figura referencial permanente (Bezugsperson) a partir de cuja intervenção a criança constitui suas estruturas e se afirma em relação ao mundo"'.

A ausência de prazo para impugnar a filiação de filhos matrimoniais propiciara que pessoas em idade avançada possam ter sua filiação negada, por ausência de vinculo biológico, ainda que presentes os demais elementos da vida que caracterizam o rico e complexo fenômeno da paternidade. A certeza sobre a paternidade dos filhos matrimoniais somente estará assegurada apos a morte do pai (e somente se ocorrida sem que esta tenha iniciado a ação, porque, caso contrario, os herdeiros do impugnante poderão continuá-la)!

A prazo decadencial de 4 anos , como proponho, a mais longo do que o previsto no direito estrangeiro. Justifica-se, contudo, a ampliação do prazo, pela maior segurança aferição da "verdade biológica" que as modernas técnicas de "DNA" permitem e pela uniformização da matéria, sendo este o prazo previsto no novo Código Civil para a anulação do reconhecimento voluntário de filhos não-matrimoniais (art. 178) e, igualmente, o que tem o filho para impugnar o reconhecimento da filiação realizado quando de sua menoridade (art. 1.614).

Por tais motivos, propõe-se seja alterado o art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002.

Sala das Sessões, 23 de abril de 2002
Deputado Virgilio Guimarães