PROJETO DE LEI Nº 3377, DE 2000

Autor: Deputado Aloízio Mercadante

Dispõe sobre a utilização e a pesquisa do código genético e dá outras providências.

(APENSE-SE AO PROJETO DE LEI N° 4.610, DE 1998)


O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º O código genético, conhecido cientificamente por genoma, é privativo de todo organismo vivo, sendo mantidas sua individualidade e inviolabilidade como condiçao primordial para preservação de sua vida e dos princípios e valores éticos, morais e culturais.

Parágrafo único. Entende-se por genoma a coleção de genes com as instruções vitais necessárias para a identificação e geração de qualquer organismo vivo.

Art. 2º A utilização e eventual manipulação do Código genético para fins de tratamento e/ou pesquisa médica e científica só serão permitidas, de forma livre e esclarecida, e por documento legalmente reconhecido, pelo seu portador, quando adulto. em perfeitas condições de saúde física e mental, e pelos pais ou responsável legal, quando for o caso.

§ 1° No caso do portador ser cadáver, a permissão será dada pelos pais, pela família ou pelo representante legal.

§ 2° No caso do portador ser cadáver sem identificação ou de família desconhecida a permissão será dada pelo Poder Judiciário.

§ 3° É assegurada a pesquisa científica do genoma desde que não seja para a duplicação de genes ou tecidos originais e modificados.

Art. 3º Sob nenhuma hipótese poderá o código genético ser utilizado para fins de registro de identificação, arquivo médico, científico ou afim, encaminhamento à obtenção de emprego ou trabalho, aceitação em seguro de vida, acidentes pessoais e de trabalho ou saúde e qualquer outro tipo de sistema de seleção de candidatos em funcionamento na sociedade.

Art. 4º O art 18 da Lei n° 9.279, de 15 de maio de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação:

Art 18 Não são patenteáveis - ........................................................

III - o todo ou parte, dos seres vivo, incluindo o genoma, exceto os microorganismos transgênicos que atendam aos três requisitos de patenteabilidade - novidade, atividade inventiva e aplicação industrial - previstos no art 8° e que não sejam mera descoberta.

Parágrafo único. Para fins desta lei, microorganismos transgênicos são organismos, exceto o todo ou parte de plantas ou de animais, que expressem, mediante intervenção humana direta em sua composição genética, uma característica normalmente não alcançável pela espécie em condições naturais; e genoma, a coleção ou o conjunto de genes que representam a identificação ou a forma química do código genético de qualquer organismo vivo."

Art. 5º Constitui crime o descumprimento a quaisquer dos dispositivos desta lei, sujeitando-se os infratores às penas:
I - se o infrator é identificado como pesquisador ou divulgador, reclusão de 4 a 8 anos, dobrando-se a pena em caso de reincidência;
II - se o infrator se utiliza das informações com o intuito de discriminação de indivíduos, reclusão de 2 a 4 anos, dobrando-se a pena em caso de reincidência.

Art. 6º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA
O Projeto Genoma levado a efeito por dois grandes consórcios internacionais, um europeu, outro americano, apresentou recentemente a seqüência inicial da coleção do código genético humano. O avanço científico é considerável e sem precedentes na história médica e científica da sociedade humana: o homem passa a ter condições de ser mapeado geneticamente e, a partir daí, abrir possibilidades técnicas e científicas para a cura e a prevenção de doenças no ambito da estrutura do DNA (ácido desoxirribonucleico), muitas delas que há tempos enfermam e matam milhões de pessoas no mundo.

Doenças hereditárias como o mal de Huntington, a anemia celular e a fibrose cística, por exemplo, podem estar com seus dias contados. Pessoas saudáveis podem pensar em futuro próximo a realizar exames para verificar se são predispostas a certos tipos de doenças e iniciar tratamento genético para evitá-las. Diagnósticos de doenças passarão a ter uma precisão bem mais acurada que os que são feits hoje em dia. Novos tipos de tratamentos terão espaço ampliado de atuaçao. O bem-estar da humanidade terá certamente uma melhoria inimaginável.

Esta melhoria, no entanto, estará acompanhada de perigos igualmente inimagináveis, se não forem tomadas medidas para preservar, antes de tudo, a privacidade, a individualidade e a inviolabilidade do seqüenciamento genético, bem como os princípios e valores éticos, morais e culturais que regulam a vida. Manipulação do DNA para a "fabricação" de novas formas de vida nas espécies humana, vegetal e animal, a depuração genética de cunho racial, a discriminação de saúde de indivíduos para a obtenção de emprego ou trabalho ou para inclusão em planos de seguros de saúde, vida e acidentes, estão entre os perigos mais comentados em toda a mídia internacional.

Um alerta, porém, deve ser feito a todos os pesquisadores envolvidos nessa conquista inimaginável da ciência: não há que se brincar de Deus. O fato de vir a se saber o seqüenciamento genético e suas mais diversas implicações não significa que entendemos a vida e que a podemos manipular ao bel-prazer do conhecimento. Não é possível substituir milhões de anos em que a natureza trabalhou para assegurar um meio ambiente equilibrado e saudável por alguns anos de pesquisa científica.

O Brasil não pode, nem deve ficar fora dessa discussão, principalmente por sermos portadores de uma rica biodiversidade, onde sobressaem recursos genéticos variados e muitos ainda desconhecidos. A natureza aqui é mais abundante em riquezas naturais que o acúmulo próprio de conhecimento. De. todas as maneiras, faz-se necessário, de antemão, criar salvaguardas legais para que a pesquisa genética no âmbito do DNA possa vir a ser feita sem discriminar indivíduos, ameaçar grupos populacionais ou violar os princípios e valores éticos, morais e culturais. Este o propósito deste projeto de lei que esperamos seja acolhido por todos os nossos pares.

Sala das Sessões,
Deputado Aloízio Mercadante